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terça-feira, 12 de dezembro de 2017
Os cães velam por mim
Não sai medo da boca dos cães, nem fúria
nem ponta de rancor.
Somente um uivo, um estertor.
Pediam tão pouco; um osso, um resto de carne,
um fingimento de ternura, e nada tiveram,
e nada conquistaram.
Somente o desprezo e a fome,
e a vizinhança ardente de morte, numa berma da estrada,
enquanto seguiam o rasto dos cegos
demandando a promessa de luz das catedrais.
Os cães não sabem nem querem vingar-se
Depressa trocam os sinais de cólera
pela promessa de um afago
e depois rebolam-se na erva como se voltassem
à infância amamentada na sombra dos quintais.
Eu amo os cães e também os gatos,
e só dos homens desconfio e me defendo
por serem os únicos que sonham, olhando o céu
sem nunca deixarem de enterrar no lodo
as raízes mais mesquinhas da ilusão
de poderem ser deuses.
Vêm os cães e põem em em fuga os vultos arqueados
dos que cercam a casa. Sem dó.
Não se pode morder nem matar o que é imaterial.
Os cães, mesmo os de pedra, velam por mim
enquanto eu invento os nomes que hei-de dar
aos temores que me invadem a escrita.
José Jorge Letria
Prosa
(Coração sem abrigo)
quarta-feira, 12 de setembro de 2012
O passado fica nós passamos
O passado é sempre um destroço fumegante,
uma sombra que nos persegue,uma pele da nossa pele
que não aceita compromissos ou rupturas.
Irá connosco até ao fim, como as tatuagens
e as cicatrizes,como uma ferida incurável na voz.
O passado desagua no delta das nossas incertezas,
fantasma omnipresente do que deixámos por cumprir.
Lembras-te de mim, neste retrato,tapando o rosto, com medo do vento e com vergonha de ter medo?
Lembras-te de nós, tão longe de casa
a passearmos pelas ruas íngremes de uma cidade, sem nome mas de perfume intenso?
Lembras-te de ti a morrer aos poucos dentro de mim
com a serena indiferença de quem imagina
que tudo é imutável, só porque o queremos imutável?
É isso o passado: o sentimento por trás da imagem,
a recordação colada à fotografia, o aroma de uma despedida que ficou para sempre inconfessada.
Nós passamos, mas o passado fica, teimosamente,
a lembrar-nos que ainda temos muito que passar,
sorriso asfixiado contra um vidro fosco
onde os pássaros embatem e morrem, arquejantes,
vitimados pela armadilha do fulgor do sol.
José Jorge Letria
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